Práticas Agroecológicas

Correção das características físicas, químicas e biológicas dos solos por meio da construção de currais no interior dos campos de cultivos na época seca

Relato submetido por Fábio Paulo Lunge António

  1. Contextualização da localidade da experiência 

A presente experiência foi realizada na província da Huíla, município do Lubango. Geograficamente encontra-se localizada na região sudoeste de Angola. A província possui uma extensão territorial de 79023km2, dividida administrativamente em 14 municípios, maioritariamente rurais, aonde actividade agro-pastoril representa uma importância na actividade produtiva e económica das famílias.  

O município possui uma extensão territorial de 3140km2 e quatro comunas nomeadamente Hoque, Arimba, Quilemba e Huíla vide fig nº 1. Residem nele uma população de aproximadamente 960 558 habitantes. O elevado número de habitantes, assim como percentual de habitantes (mais 50%) que vivem e dependem de forma indirecta da actividade agro-pastoril, estão entre as razões pela qual foi selecionada este município.

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Fig nº 1 - Divisão política e administrativa do município do Lubango.

A pobreza é um dos principais problemas que assola as famílias, principalmente no meio rural, situação agravada pelos efeitos das alterações climáticas que tem afectado a região, comprometendo a produção agro-pastoril. Esta situação tem causando alto índice de êxodo rural, obrigando muitos jovens, crianças e até velhos, a abandonarem suas terras e refugiando-se no principal centro urbano da província (Lubango), deixando a condição de pobreza rural e, sujeitando-se a um modo de vida miserável na cidade. 

O clima é o global húmido e moderadamente quente, com temperatura média anual de 18,6°C, sendo o Lubango uma das cidades mais fria de Angola. Junho e julho são os meses mais frios, com eventuais geadas. Nos últimos 10 anos a chuva tem sido muito irregular, com início tardio, final precoce e má distribuição durante a época.

Estando os recursos hídricos relacionados directamente com o clima, a região tem debatendo-se com problemas de estiagem cíclicas, o que de certa forma tem condicionado as reservas de água naturais. Os principais rios que atravessam o município são de regime temporário, o que significa que apenas possuem água na época chuvosa.

Os valores da precipitação nos últimos 13 anos têm uma média anual de 880 mm. Registam-se dois máximos de precipitação, um em novembro e outro em março. Em janeiro - fevereiro tem lugar um pequeno período seco de duas a três semanas, em alguns anos sensivelmente mais prolongado.

A agricultura e a pastorícia de subsistência caracterizam o sistema produtivo da região. A produção de sequeiro (dependente a 100% da chuva), tem grande expressão no seio das famílias camponesas, permitindo-lhes realizar o cultivo de cerais (milho, massango e massambala) e leguminosas (feijão) utilizadas na dieta das famílias locais. As irregularidades das chuvas tem causado impacto negativo na produção agrícola e na criação de animais, pois, os mesmos encontram dificuldades nos meses mais secos para irrigar os campos, darem de beber e comer os animais.

Com a actividade agrícola comprometida devido a estiagem, muitas famílias dedicam-se agora a produção de carvão que substancia-se no abate de árvores (vide fig nº 2), o que tem reduzido a fertilidade dos solos, pois, o ciclo da matéria orgânico encontra-se interrompido, em consequência do desaparecimento da vegetação e de outros seres vivos outrora existente neste ecossistema. 

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Fig nº 2 – forno de fabrico de carvão e a respectiva matéria-prima (partes de arvores).

De realçar ainda que a vegetação para além da função de enriquecer o solo em matéria orgânica, ajuda também na redução da acção dos agentes erosivos e na manutenção do equilíbrio dos ecossistemas naturais.

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  1. Solo degradado  

Fig nº 3 - Ravina originada pela más práticas antrópicas.

A conjugação de práticas nocivas ao ambiente, como é o caso do abate de árvores desregrado e em grande escala, assim como o uso do fogo em época de caça e para remoção no capim, tornou muitos solos improdutivos. Com vista a mudar esse quadro, um conjunto de acções amigas do ambiente (determinação de áreas de preservação obrigatórias de espécies animais e vegetais, a mudança de local dos currais temporariamente para os campos de cultivo etc) praticadas pelas comunidades ao longo de muitas gerações e, hoje quase que abandonadas, estão a ser rebuscadas e incentivada como formas de reposição da fertilidade dos solos e garantir a produção agro-pastoril e recuperação do património ambiental.

  1. Descrição da experiência 

Tratando-se de uma região com alta população ganadeira (principalmente gado bovino), em que a pastorícia apresenta-se como sendo a actividade principal e o boi um símbolo de respeito e não propriamente de riqueza económica, em que apenas em circunstância de morte de um mais velho ou em datas especiais são mortos ou vendidos bovinos.  

Com os solos pobres em nutrientes fruto das acções nocivas ao meio ambiente (queima e abate de árvores), juntamente com o problema da estiagem que tem exigido dos produtores a adopção de melhores técnicas de cultivo e uso de variedades adaptadas, a produção de alimentos começa a tornar-se cada vez mais difícil, tornando muitas famílias pouco resilientes às alterações climáticas e consequentemente susceptíveis a insegurança alimentar. 

Com vista a mudar o quadro e a garantir um uso da terra de forma sustentável, sem que haja necessidade de recorrer à produtos químicos que acabam por danificar os solos quando mal manuseados a curto, médio ou longo prazo, e, muitas das vezes não ao alcance das finanças das comunidades rurais, surgiu a necessidade de trabalhar mais na agricultura ecológica, que assenta essencialmente na produção de alimentos com a utilização de produtos locais, de fácil acesso e amigos do ambiente. 

Para garantir a melhoria das características dos solos (física, química e biológica) de forma sustentável, barata e de fácil execução, às comunidades rurais começam a ser incentivadas a intensificar a prática de mudança de localização dos currais dos animais, nos vários campos de cultivo, com o objectivo de concentrar a matéria orgânica resultante dos dejectos animais, com objectivo de enriquecer do solo em húmus.

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  1. Curral tipicamente muila e dejetos animais utilizado como adubo orgânico.

Fig nº 4 - Curral de animais (bovinos).

 Em termos concretos, com essa prática ou técnica pretende-se melhorar quantitativa e qualitativamente a introdução de nutrientes, melhor capacidade de retenção por parte dos solos e consequentemente possibilitar o alcance de melhores e maiores níveis de produtividades.

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  1. Local utilizado como curral recentemente. 
  2. Estado físico de um solo utilizado como curral.

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Terreno que aguarda pela construção do curral nos próximos tempos. Diferença notável entre um solo antes ocupado por curral de um que aguarda pela sua ocupação.

Fig nº 5 - Terrenos utilizados para construção dos currais.

Com a introdução de matéria orgânica (estrume) o solo melhora as características químicas, físicas e biológicas, aumenta a capacidade de retenção de água, elevando assim os níveis de produtividade agrícola, permitindo a obtenção de excedentes de produção normalmente destinada à comercialização.

Esta prática trará consigo enumeras vantagens, pois para além de melhorar a estrutura dos solos, permitirá também controlar a sanidade animal, reduzindo assim a possibilidade de surgimento de doenças, para o caso de currais constituídos por manadas muito numerosas, o conflitos entre os animais machos que muitas das vezes terminam em mortes será de certa maneira resolvidos ou minimizado. Por outro lado, não precisam andar a transportar o estrume de um lugar para outro, optimizando assim o tempo e recursos dos produtores.

5. Conclusão

Com os problemas de insegurança alimentar que as populações do meio rural e não só têm experimentando nos últimos tempo, motivada em grande escala pelas mudanças do clima que substancia-se em estiagem prolongada, chuvas mal distribuídas e época chuvosa de início tardio e finais precoces, a prática das duas principais actividades (agricultura e pastorícia) desenvolvidas pelas comunidades da área de estudo, não têm sido capaz de garantir o mínimo de produção de alimento para a subsistências das famílias.

De realçar também, que para além do factor limitante de produção acima exposto, a fraca oferta de insumos agropecuários, a fraca e ou falha de assistência técnica aos camponeses por parte de instituições públicas afins, contribuem para a baixa produção e produtividade agrícola e redução do efectivo animal. 

Com o incentivo à essa prática, conjugado ao potencial ganadeiro de que a região é detentora, o problema da improdutividade dos solos começará a ser paulatinamente resolvidos e, por outro lado, a probabilidade de degradação dos solos por uso irracional de fertilizantes químicos que na maioria dos casos são usas sem conhecimento exacto do estado nutricional do solo.

Por outro lado, o aumento dos níveis de produção e produtividade agro-pastoril por parte das comunidades rurais, a necessidade de degradação do meio ambiente (abate de árvores para produção de carvão) será cada vez menor, o que permitirá a natureza recuperar de forma paulatina as características e ecossistemas nativos.

Com a concretização deste projecto o Desenvolvimento sustentável no binómio fertilizantes orgânicos – agricultura/pastorícia será alcançado, permitindo às gerações actuais a satisfazerem as suas necessidades sem pôr em risco a possibilidade dos filhos e netos também usarem as mesmas terras e animais como meio de subsistência.

Próximo passo

Realizar encontros de troca de experiência entre comunidades (campos de demostração/escolas de campo) para avaliarem e compararem os resultados conseguidos por meio da adopção desta prática às atuais, para que outras comunidades também venham receber de braços abertos iniciativas deste género.

1 Direcção Municipal da Agricultura, Pecuária e Pescas do Lubango

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